Nada é o que permaneceu:
nada, o arrojado epíteto
Que pronunciei pela noite
tantas vezes até ser transportado
Para um escuro sono, ou o
sono que continha um sonho.
Nisto havia uma enorme
ausência contagiosa,
Mais espaço do que espaço,
sobre a nuvem e o lodo,
Definidos apenas pela sua
excessiva oscilação.
Despojado até à indiferença
nas curvas do tempo,
Cujo fim eu conhecia, acordei
sem um desejo,
E saudei o zero como um
paradigma.
Mas agora despedaça-se: as
imagens surgem incendiadas
Na calma esfera onde tenho
vivido,
Regulando a paisagem ainda
intacta:
O poder que imaginava, que
presidia
Supremo a devastações
abstractas,
É apenas uma mudança; os
átomos que o dividiam
Completam, sem o saber, novas
combinações.
Apenas descubro uma infinita
finitude
Naquelas variações belas e
estranhas.
É o desespero de que o nada
possa existir
A cintilar no espírito e a
deixar uma marca fumegante
De temor.
Olhem para cima. Nem presa nem
liberta.
Uma questão inútil paira nas
trevas.
thom gunn
a destruição do nada e outros poemas
trad. maria de lurdes
guimarães
relógio d´água
1993