saltei os dias, enquanto minha mãe embalava a máquina do tempo, tentando esquecer os gritos ruidosos. sentia o vai e vem acelerado da vida vazia, que guardava na memória das redes de secretos desejos. carregava nos ombros cactos. picavam-me a pele queimada pelo salitre. não havia dor, o sangue escorria como áscuas. a paixão perseguia um rasto agudo. fulgurava a pressão aterradora do sibilar da cobra pérfida, que atravessava o silêncio, da minha memória. saboreava no outro lado do dia, pitangas que colhia no quintal sem paredes. um rasto de esperma precário, fazia-me recordar erros em salas de tortura. senti-me um lugar. os sonhos transmitiam nevoeiros de palavras embaciadas mas hábeis. desnudava muda o ardor das manhãs. no espelho da casa onde vivia, as sombras tomavam formas de corpos rasgados de mim, enlaçados na sofreguidão do ciúme.
os pássaros com mangonha, debicavam a goiaba pútrida. estendi os dedos e toquei nas aves. sobre a mesa da sala, outras mãos, unidas nas sombras, filhas de estrelas escondidas e sem rostos. mãos que acariciavam o saber místico dos sentires. os dedos dançavam no brilho dos meus olhos, senti-os gélidos, extensos. olhei-os fixamente e saltavam miraculosas cores luminosas. feriu-me o gelo intenso da luz.
por fim, adormeci no sumo do fruto proibido.
entrei no engano das imagens...
l.maltez