O fogo despe-se cada vez mais cheio de
alegria alisado no vento de cada 
    poro da aurora 
    Começa-se a abrir o Sol em gotas de sangue
tatuadas de esperma 
    Há uma flor de lava no fim de cada braço no
fim de cada perna no fim 
    dos tempos 
    E uma chuva de cinzas e de espinhos caminha
a meu lado onde começa o 
    mar das grandes lanças de água 
    É todo o teu ventre a cantar nas minas da
catástrofe de noites sem 
    véus de rios que começam a vida de gestos
no crepúsculo 
    São os teus olhos voando sobre os frutos da
tempestade 
    É a cabeleira da Terra envenenando o ar de
beleza ao ritmo alucinado 
    com que abres as pálpebras deixando sair os
lagos da tua infância 
    e a luz louca da crisálida que nos gerou
dissimulada em cada pedra 
    em cada cama onde morremos juntos 
    Chicote ronronando por cima de nós em
noites desmedidas na coragem 
    de ver nascer uma nova manhã e uma nova
estrada e uma nova boca incrível 
    Monstros sem ordem génios galopando na
respiração estrelada dos meus 
    pulmões Primaveras a recolher numa outra
vida numa outra vida amante 
    Olhar suculento mestre do horror e da
audácia gelada em cada canto em 
    cada flor de fumo colada aos ossos dum
horizonte inocente e inesgotável 
    Poeira dum astro pré-existente ao nosso
espiral dos dias que estreitamos 
    puros tripas da raiva vegetal que
embrulhamos em cada palavra 
    Fogo perpétuo fruto espantoso de bandeiras
negras e vermelhas comboio 
    que esmaga e canta e ninguém deterá 
    Fuzis do hálito esbraseado danados
embraiados num sinal nos ares num 
    sinal vermelho 
    Na cinta a pistola de cada injustiça nas
costas a metralhadora da 
    porrada que nos deram no bolso um chacal a
sorrir-nos no sexo tu 
  
Tu meu avião de vinho minha rã no cérebro meu castelo de múmias 
    minha jovem eterna de mãos de radium minha
fonte que enche a boca de estrelas 
   meu grande ventre de movimentos marítimos
meu incêndio possuído numa cama de   meteoros 
    meu sopro de todas as potências minhas
costas de Mar e de Terra 
    minhas coxas de deboche minha mulher de
movimentos de fuzilamento de movimentos loucos 
    minha flor de sangue de ferro de esperma
minha destruição luminosa 
    minhas nádegas de noite e de loucura 
                                            
                                            MEU
AMOR 
    Habito a lealdade dos presságios 
    Começo a ser um bom leito para o meu sangue
ernesto sampaio
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poesia surrealista portuguesa
antologia de perfecto e. cuadrado
edicións laiovento, compostela
1996