Chegou com a alegria desajeitada de uma camponesa 
de quatro anos. Tem o olhar ríspido e coquette 
da minha mãe de 75 anos aos quatro. 
E quando essa mãe morreu, tentou 
ser tão sensata que a sua cabeça 
se inclinava enquanto dizia: «quando eu 
morrer, hei-de chorar imenso, sabes.» 
Não precisa de pai a não ser para as bonecas. 
Como é que hei-de fazer, pergunto. «Sentares-te aqui 
na cadeira, e leres o jornal,», disse ela. Brinca à vida, 
uma horinha, e depois a outra coisa. 
Ela ensina-me o que é a poesia: de um nevão 
seguir apenas um floco. Com ela aquilo que quero 
é sempre possível: que seja hoje. 
herman de coninck 
os hectares da memória
trad. colectiva, rev., complet. e apresent. nuno júdice
poetas em mateus
quetzal
1996
