Suspendamos um pouco a alma
à semelhança de um objecto
pesado e enorme
Aonde chega a matéria severa
forja um bem aparente
dá forma a um signo
artificial
Os elementos primários criam
o cheiro da ameixa no susto mole
— cera nos punhos rotos
jugo da fome perseguindo a
fortuna
assistindo ao seu declínio
o visível sustém-se pela
seiva
vespertina, o visível
abomina o jejum
persiste como um insulto
indigno
Algures um sentido repousa
mais fundo, permanece até
que o tempo finde
— Aquela criança desagregada
não cabe à mesa
não se segura sozinha raiada
de espuma
porque aplaude o gesto
póstumo o gesto
que se esboça antes das
próprias mãos
Desse seu costume informe de
arrastar
um destino interdito, à
margem do que
é normal e é homem
— Assistimos ao riso
crescente daqueles
para quem a criança
está para além
um ser nulo,
fragmentário
O jugo da busca não é vão
inanimal apenas
ângela canez
oficina de poesia
nr. 3 Junho 2004
coimbra
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