15 setembro 2017

josé ángel cilleruelo / bairro alto



1
Tudo tem aqui o mesmo abandono:
um quarto com janelas
para a rua e um corpo sem desejo
diante da chuva. Uma mulher que passa
– a luz presa debaixo das meias –
e que desaparece, deixa
o eco de um gemido na pupila
e a saliva quente do suor
na memória.
                       Hotel sem graça,
uma jarra com água à cabeceira,
uma revista dentro do armário,
o fio com um menino Jesus
sobre o decote, e a mão – a minha mão –
percorre o náilon.
                                 Agora as páginas
do diário devolvem-me esta noite,
fria noite num quarto frio.

Para que servirá a inteligência?
Um número na porta, um cheiro acre.



josé ángel cilleruelo
salobre
antologia
trad. joaquim manuel magalhães
averno
2004





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