09 abril 2015

cecília meireles / é preciso não esquecer nada



É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.

O que é preciso esquecer é o dia carregado de actos,
a ideia de recompensa e de glória.

O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos connosco, pois o resto não nos pertence.

  

cecilia meireles





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