05 abril 2023

sharon olds / a mãe

 
 
No alheado silêncio que se segue ao banho,
quente na toalha branca de leite, o meu filho
anuncia que eu não o hei-de amar quando morta
porque as pessoas não são capazes de pensar quando mortas. Começo
por não ser capaz de pensar – não o amar? O ar de fora
da janela é todo preto, a velha espigueta
começou já a perder as folhas…
aperto-o contra mim, branco como uma bóia
e a minha morte como água negra emerge
velozmente no quarto. Digo-lhe que o amava
antes de ele ter nascido. Não lhe digo
ai de mim se o não amar depois de
morta, sendo afinal a necessidade
a mãe do engenho.
 
 
 
sharon olds
satanás diz
trad, margarida vale de gato
antígona
2004
 



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