05 novembro 2022

abdul hadi sadoun / que passem estes dias

 



Que passem estes dias
e a chuva me acaricie
ou me magoe,
é o mesmo.
A montanha vizinha
persiste em olhar-me,
em falar comigo,
a pobre, rocha gigantesca,
persiste na solidão
e eu sobre ela sentado
encurtando o breve caminho do voo.
 
 
 
abdul hadi sadoun
todos escrevem sobre o amor menos tu
trad. manuel neto dos santos
editora urutau
2021

 




04 novembro 2022

joaquim manuel magalhães / adiafa

 



Esta noite dormi com os amantes
que tinham morrido. Ouvia-os
no espaço por onde ondeia o nada.
nenhum falhou no seu precipício.
 
Noites com divãs perto das janelas,
tapetes que deixavam nas costas
as suaves marcas da lã,
lamparinas que vacilavam quartos desaparecidos.
No enclave da vida adormecem-nos com jeito
em braços prontos para a corrida sem fim
com que ganhamos a mordaça do reconhecimento.
 
Visitam-me com a separação,
respiram sem som algum,
com a alma já não peregrina.
Emprestam à minha mão o sexo
que também eles um dia prenderam,
o obscuro onde a garra deflagra
para que chegue um resto desse odor
que deixavam ao partir, num fim de tarde,
na gabardina colhida depois de toda a roupa
ter sido o nosso chão.
 
Na rede transitória da paixão já sem causa
encontro a semente cujo limite
é o entorpecimento, e também a pujança
que perdeu a autoridade dos sentidos.
 
Há uma distância destruída
mesmo no lugar sobre o qual ousamos
reconhecer-nos sem nenhum sinal.
Perdem no artifício a proporção,
eles que foram sempre o meu aviso
sem nada cumprirem do que me avisavam.
E nessa lonjura de um olhar que quer perder-se
raiam na beleza dos mais justos filmes pornográficos.
 
O dízimo do mundo numa noite de outono,
o lugar aceso da lareira enferrujado,
o vazadouro agreste em que nos cerraram.
O que mata transporta estas oferendas,
esta catástrofe apaziguada,
enquanto detrás de um qualquer portão
se aproxima a máscara de cada forma,
toda por dentro da ossatura já desfeita
e nem então desaparecem.
 
Tudo o que se diz ou faz
sem o amor ter chegado ou porque partiu
é um trabalho desconjunto
pronto para a saliva do arrependimento.
A qual em massa com cada regra esquecida
nada consegue nunca vedar.
 
Tornam-se inteiramente aquilo
que certa vez me deram
com o seu toque da morte.
Trazem o amor e o pequeno amor.
E quando um amplo quarto no coração
nos renova sem qualquer travessia
afastam-se para o que não tem fim.
 
Permaneço no escuro, entrevejo
a rega rarefeita que cintila, descubro
o ritmo decepado da matéria
e no lugar que nos segura
estamos assim acompanhados
pela boa aventurança do que só existe
na mão ausente em despedida.
 
Não podia nem maior ser cada avanço
e contudo o resto do corpo inebriado
esqueceu-se dos caminhos, escuta
amortalhada a planície incolor
e quase toca os que não mais a voltarão a ver.
As conversas vinham daí, daqueles sons deitados
onde golpeava um foco que reacendia pupilas
e as suas pernas estendiam-se no ferro
de um repouso, à sombra
das altas neves que na cerviz dormiam.
 
A força, que fez jorrar o meu mais dentro
em líquidos que nos apagam a fogueira
logo reacesa, é um cordão sem nó que prenda,
um gaveto oculto de que são estilhaço,
um contágio divagante, um aconchego bárbaro
à pouco urgente divindade da vida.
 
Quando a meio da noite me levanto
e vejo pousado o comprimido
não percebo como adormeci tão de repente.
Mas entenderei depois que na madrugada
o pavor não queria senão entender
a sabedoria fantasma das glândulas
que tanto assusta quando a alba tarda em romper;
e depois de vinda nos obriga a agir
com os lençóis pousados na cabeça
à espera da dissolução e do porvir.
 
Com tanto túmulo para visitar.
 
 
 
joaquim manuel magalhães
alta noite em alta fraga
relógio d´água
2001





03 novembro 2022

maria gabriela llansol / inquérito às quatro confidências

 


16 de Março de 1995
 
 
_________________________________cada um de nós escreverá o que viu – «ex-crê-ve-rá», como diz o meu companheiro filosófico – e, como rotas planetárias diferentes mas do mesmo sol, estaremos em conjunção no circo da estrebaria de Herbais, daqui a nove meses e alguns dias.
 
     No há que escolhi,
a minha espinha dorsal é o júbilo. Escrever
está dentro do redil do paraíso, que é também uma sebe onde
eu entro através do ar; minha constituição material é frágil;
de facto, os pés são a minha única matéria não
constantemente atravessada pelo ar,
que leva imagens,
traz imagens e é,
muitas vezes,
persistente nos perfumes que a tristeza leva.
 
     Quem foi a tristeza?
 
 
 
maria gabriela llansol
inquérito às quatro confidências
relógio d´água
1996
 




02 novembro 2022

antónio franco alexandre / corto viaggio sentimentale, capriccio italiano



4
 
mas chegados em terra o que tinha
para te dar era pouco. vivia, então,
marquês, de ramo em ramo;
dizia hegel, murmurava kant,
adivinhava verdi de assobio;
em duras mãos, em duros lábios
colhia o suor branco do teu corpo
como água do lume.
 
 
 
antónio franco alexandre
quatro caprichos
assírio & alvim
1999




 


 

01 novembro 2022

luís miguel nava / transparência

 



 

Momentos há em que a toda a nossa volta os objectos se tornam insuportáveis como se nos roubassem o ar, como se neles houvesse uma respiração onde o ar e a luz interviessem simultaneamente. Entre os sabores que tocam no meu espírito procuro então o que melhor me possa devolver à transparência, não a dos espelhos ou dos vidros, que a literalidade impregna, mas a abrupta transparência dos sentidos.
 
 
luís miguel nava
o céu sob as entranhas
poesia completa (1979-1994)
publicações dom quixote
2002




 


31 outubro 2022

juan luis panero / cerimónias de outono


 
Entre a pele e o osso ainda respira um tremor
– isso a que chamam alguns alma –
um obstinado estertor, inútil esforço de sobrevivência.
A vida e as suas ocultas raízes tenazes aferram-se
no húmido entardecer, de princípios de outono,
enquanto o distorcido rosto representa o seu estranho papel
e o coro, com a sua estúpida e crédula aparência,
aposta no mais além ou no mais aquém, que importa?
Apenas uma respiração, apenas uma respiração entrecortada,
entre a pele e o osso,
simboliza um final ou, simplesmente,
o nevoento sonho de outro sonho deserto.
E para quem tantas aparatosas expressões,
se todas as testemunhas, os olhos que, quase às escondidas,
se olham e se encontram, unicamente afirmam
o terror – tão real – do próprio cadáver delas?
Depois – fora do hospital inóspito –
a última luz do sol desenha o mar,
ocultando-se detrás do verde e da pedra do Monte Igueldo
e treme nas tuas mãos o pesado copo
que leva aos teus lábios o vidro funerário,
onde o álcool e o gelo desenham outra morte.
 
 
 
juan luis panero
poemas
trad. joaquim manuel magalhães
relógio d´água
2003

 



 

30 outubro 2022

augusto meneghin / brasil

 
dedicado ao falecido Ginsberg
 

 
                Tudo, nos séculos, transformou-se incessantemente. Só ela,  a
                classe dirigente, permaneceu igual a si mesma, excedendo sua
                                                                       interminável hegemonia.
 
                                                                                       Darcy Ribeiro
 
 


Brasil não sou um pão
Como andam suas novas meias?
Já descobriu o sentido de suas cores e palavras?
Brasil preciso de um colírio que me enjoe
Estou realmente apaixonado pelo Rio São Francisco
Você viu o que fizeram no regime militar?
Brasil eu te dou cem reais e você me devolve uma favela
Ontem mesmo alguém virou um número de balas perdidas
Brasil eu quero chorar mas você só pensa em rir
Será que você se algemou na TV?
Brasil eu não sei o que é justiça
Quando eu era pequeno assisti a copa de 94 e tudo
                                                     parecia mágico
Mas hoje sei que era apenas o sabor daquele misto-quente
Você sabe algum segredo?
Brasil você fabrica religiões
Será que as filas são algum tipo de redenção?
Brasil suas crianças estão fodendo
Meus votos nunca decapitaram ninguém
Queria ver um quadro de Portinari sobre um massacre
                                                               no Senado
Brasil eu não sou um de seus cristãos
Há uma guerra entre os tucanos as estrelas e as forjas
Brasil seu samba não é mais negro
Foi você que comeu minha mãe e deixou meu pai sem
                                                             emprego na
gaveta antidepressiva
& quando acabarem com nossos lagos?
Brasil você precisa transar com alguém
Precisa saber que isso não é uma piada e passar adiante
Brasil eu não sou louco
Sonhei que tinha uma ladeira cheia de poetas mortos
& eu gosto de seu Café
Brasil por que estou insatisfeito se já disseram que tenho
                                                                      tudo que
Muitos não têm?
Brasil eu ainda quero chorar
Nunca li na escola um poeta Assassino ou Gay ou que
                                                              tivesse um
Vício Maldito (eu nunca soube)
Por que Brasil?
Sua porta é um grande arquivo de Secretaria
Eu nunca contei seus estados no mapa
Brasil eu quero seu cu
Não importa o que aconteça será sagrado
D. Pedro é um babaca e seu cavalo branco mentiroso
Brasil Tiradentes não é Jesus
Será que você assombrou a liberdade?
Por que ninguém traduziu o Mahabhárata?
O Redentor combina com sorvete
Brasil você é uma novela das oito sem final escrito
Brasil eu sou angústia
Já me excitei com o amor triunfante de Caravaggio
Brasil é preciso fazer alguma coisa sem chamar os médicos
Meu câncer virá de suas chaminés de diamante
Brasil seu julgamento é uma hipótese
Você ainda não coroou as verdadeiras putas
Brasil você precisa de um conselho
Essa noite eu tive um sonho erótico com suas pradarias
Brasil porque é preciso morrer queimado na Amazónia
Porque eu estava vivo a partir de 87
& porque serafins me visitavam em Sodoma
Brasil eu amo São Paulo
Sou um garoto do interior que beijou Baudelaire e
                                          abandonou as igrejas
O blues de Ray Charles me transformou em Clarividente
Brasil há muita dor
Nas entranhas de Brasília não existem violões
Brasil eu preciso de uísque
Não sou capaz de ser um trabalhador
Amanhã meu alfaiate vai tirar as medidas para meu
                                                              terno de
Defunto
Brasil descobri que sou um Mistério
O que realmente me incomoda é a vastidão dos oceanos
Vou sair para comprar um cigarro & já volto
Brasil suas ampolas são metafísicas
Já cortei o cabelo em um Barbeiro Embriagado
Brasil eu não conheço o sue sexo
Brasil eu queria uma farmácia cheia de floriculturas
Brasil eu queria uma farmácia cheia de poemas
Os pardais não parecem brasileiros
As Academias são manicômios da Igreja
As Igrejas são manicômios da Miséria
Brasil eu desejo um paradoxo
Quero Augusto dos Anjos em versos brancos
& morar na Sombra de sua Melancolia
& ser agarrado pela noite sem sapatos
& me afogar no mar poluído da Separação
& dançar até o Apocalipse
Das crianças mortas
 
 
 
augusto meneghin
um brasil ainda em chamas
antologia de poesia brasileira contemporânea
organiz. wilson alves-beserra & jefferson dias
contracapa
2022




29 outubro 2022

álvaro de campos / cruzou por mim, veio ter comigo,

 


 
Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
 
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
 
(Excepto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar...).
 
Sinto urna simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
É estar ao lado da escala social,
É não ser adaptável às normas da vida,
Às normas reais ou sentimentais da vida —
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento de justiça, ou capitão de cavalaria
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque têm razão para chorar lágrimas,
E se revoltam contra a vida social porque têm razão para isso supor.
 
Não: tudo menos ter razão!
Tudo menos importar-me com a humanidade!
Tudo menos ceder ao humanitarismo!
De que serve uma sensação se há uma razão exterior para ela?
 
Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,
Não é ser vadio e pedinte, o que é corrente:
É ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,
É ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que é ser pedinte.
 
Tudo mais é estúpido como um Dostoievski ou um Gorki.
Tudo mais é ter fome ou não ter que vestir.
E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente
Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.
Sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato,
E estou-me rebolando numa grande caridade por mim.
 
Coitado do Álvaro de Campos!
Tão isolado na vida! Tão deprimido nas sensações!
Coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia!
Coitado dele, que com lágrimas (autênticas) nos olhos,
Deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita,
Tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha pouco, àquele
Pobre que não era pobre, que tinha olhos tristes por profissão.
 
Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!
Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!
 
E, sim, coitado dele!
Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,
Que são pedintes e pedem,
Porque a alma humana é um abismo.
 
Eu é que sei. Coitado dele!
 
Que bom poder-me revoltar num comício dentro da minha alma!
Mas até nem parvo sou!
Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.
Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.
 
Não me queiram converter a convicção: sou lúcido.
Já disse: Sou lúcido.
Nada de estéticas com coração: Sou lúcido.
Merda! Sou lúcido.
 
s.d.
 
 
 
fernando pessoa
poesias de álvaro de campos
edições ática
1944






28 outubro 2022

josé gomes ferreira / de repente

 


XIX
 
De repente
tudo se tornou mais fundo
para além da superfície
das pedras sem flor
e das árvores sem voz.
 
Tão fundo, tão fundo
que até a Morte
já não precisa de sair do mundo
para caber nos olhos de todos nós.
 
(E há lá quem suporte
esta dor que eu tenho
de saber que a Morte
é do meu tamanho!)
 
 
 
josé gomes ferreira
poesia II
sonâmbulo 1941-1942-1943
portugália
1962




27 outubro 2022

amalia bautista / conta-mo outra vez

 
 
Conta-mo outra vez: é tão bonito
que não me canso nunca de escutá-lo.
Repete-me, uma vez mais, que o par
do conto foi feliz até à morte,
que ela não lhe foi infiel, que ele nem sequer
pensou em enganá-la. E não te esqueças
de que, apesar do tempo e dos problemas,
continuavam cada noite a beijar-se.
Conta-mo mil vezes, se faz favor:
é a história mais bela que conheço.
 
 
 
amalia bautista
trevo
tradução de inês dias
averno
2021

 



26 outubro 2022

albano martins / folhas

 


 

Repara: sem vento, as folhas
são como sono apenas.
Corpos ao relento,
que da morte se esquecem.
 
 
albano martins
escrito a vermelho
campo das letras
1999

 



25 outubro 2022

julien gracq / inabordável

 
 
É uma jovem mulher sob os passos da qual as imagens se erguem, profusas. Por vezes, numa senda de abril, ela levanta uma mão mole e doce tal uma pena e acalma, como que a contra-gosto, as inquietudes da paisagem – ou então a misteriosa assinatura do seu andar entre margens de betume rivaliza com o mais belo instrumento do literato. Gosto de seguir os meandros duma rua colorida, o fio dessa melodia de morte súbita que a sua aparição repercute, dum lado para o outro, do horizonte das fachadas. Que rua sonora – onde um teatro arrasado, vitrinas estilhaçadas, ardinas uivando o mais belo assassínio do século – que vidrilhos pintados a sangue, que belo sangue espumando e cantando algo parecido a trinados, a harpejos, que flácida inflexão de saxofone poderá alguma vez valer, para mim, o olhar que ela derrama, a partir do canto do seu olho preciso e sereno, o regato magnético do seu olhar que corre transbordante entre as casas como a saliva ácida dum glaciar?
 
 
 
julien gracq
sonhador definitivo e perpétua insónia
uma antologia de poemas
surrealistas escritos em língua francesa
trad. regina guimarães
contracapa
2021



 
 

24 outubro 2022

wislawa szymborska / paisagem com grão de areia




Chamamos-lhe grão de areia.
E ele a si nem areia nem grão.
Passa muito bem sem nome
genérico, específico,
duradouro, efémero,
erróneo ou real.
 
Nada é para ele o nosso olhar, o nosso tacto.
Não se sente observado e tocado.
E se caiu no parapeito da janela
é peripécia nossa, não dele.
Para ele é o mesmo cair aqui ou acolá,
sem a certeza de já ter caído
ou de estar ainda a cair.
 
Da janela há uma bonita vista sobre o lago
mas esta vista não se vê a ela própria.
Informe e descolorido,
inodoro e sem voz
e sem dor se lhe apresenta o mundo.
 
Como que desfundadamente ao fundo do lago
e desmarginadamente às suas margens.
Nem seco nem molhado à sua água,
nem singular nem múltiplo às suas ondas,
marulhando surdas ao próprio marulhar
ao redor de pedras nem grandes nem pequenas.
 
E tudo sob um céu de natureza inceleste
onde se põe um sol nunca poente
escondendo-se sem se esconder atrás de nuvem inconsciente.
Impele-a o vento sem outra razão
a não ser a de que venta.
 
Passa um segundo.
Dois segundos.
E um terceiro.
Mas são só nossos estes três segundos.
 
Precipitou-se o temo como mensageiro com notícia premente.
Mas a comparação é apenas nossa.
A figura inventada, a pressa insinuada,
e a notícia inumana.
 
 
 
wislawa szymborska
paisagem com grão de areia
trad. júlio sousa gomes
relógio d’água
1998