A minha avó dizia-me:
- não sopres as brasas
meu lindo menino não vão sujar-te os pulmões
decorreu-me a meninice como alento
expirado contra as brasas
minha querida avozinha sempre me lembrei de ti
e do jardim cor de ameixa seca
com os troncos das árvores ressequidos
e os seus vestígios de cal apagada
minha querida avozinha sempre me lembrei de ti
quis ver de novo à noite
a lua cheia, o bandoleiro do céu,
bebendo a água com lábios de prata
em sulcos de crisântemos
sempre me lembrei de ti
e dos gerânios entre os quais
compunha os meus primeiros versos
da rã com manchas verdes da minha poesia
e do estribilho dos ciganitos:
«rãzinha, rãzinha
com pernas de raminho»
minha querida avozinha sempre me lembrei de ti
e da fronte enrugada do avô
que morreu anos depois de
sussurrar-me ao ouvido o meu nome
e da sua vide adornada
com campânulas entre águas-marinhas
os anos passaram
evolou-se dos sacos o cheiro a melões de inverno
acabou o bem-estar
de Abraão sobre a nossa mesa
minha querida avozinha sempre me lembrei de ti.
adnan özer
as asas de orvalho dos ventos
trad. jorge velhote
quetzal
1997