Só há areia
E um céu
demasiado lúcido.
A transparência
intacta feriu o nosso cérebro,
Mutilou os
nossos pensamentos,
Fez nascer
violetas de fogo no silêncio.
Arrastados pelas
torrentes de luz,
Alagamos de
solidão os nossos olhos.
Nem silvados,
nem pauis,
Nem o pulsar do
álamo.
É necessário continuar,
Mas quem
descobre o rumo da areia?
Escutei vozes e
nem uma conhecia o caminho.
Inventei vultos
para me fazerem companhia,
E todos
mantiveram os olhos cerrados.
Se eram cegos,
porque me sorriam?
E porque havia
nos seus dedos
A sugestão da
cítara?
E porque me
apontou um deles
Um flamingo, um
cipreste, um lago,
Que os seus
olhos não viam
E que os meus
tinham começado a imaginar?
maria amélia neto
cicuta em março (1964)
antologia da novíssima poesia portuguesa
m. alberta menéres, e. m. de mello e castro
moraes editora
1971