Peste… «E de cada vez que li uma história de peste,
do fundo de um coração envenenado pelas suas próprias revoltas e pelas
violências dos outros, um grito claro se ergueu dizendo que no entanto havia
nos homens mais coisas para admirar do que para desprezar.»
…«E a peste cada um a traz consigo, porque ninguém,
sim, ninguém no mundo, está imune. E é necessário vigiarmo-nos constantemente
para não sermos levados num minuto de distracção a respirar na cara de alguém e
a pegar-lhe a infecção. O que é natural é o micróbio. O resto, a saúde, a
integridade, a pureza, se preferirem, é um efeito da vontade, e de uma vontade
que nunca deve deixar de exercer-se. O homem honesto, o que não infecta
ninguém, é aquele que se distrai o menos possível.
«Sim, é fatigante ser-se um patife. Mas é ainda
mais fatigante não querer ser um patife. É por isso que toda a gente está
fatigada, porque toda a gente o é um pouco. Mas é por isso também que alguns
conhecem tão fundo cansaço que só a morte os poderá libertar dele.»
albert camus
primeiros
cadernos
caderno n.º 5
setembro 1945/abril 1948
trad. não disponível
livros do brasil
1973
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