15 janeiro 2020

claudio rodríguez / adeus



Trocaria a vida por qualquer coisa
esta tarde. Qualquer coisa pequena,
se alguma há. Martírio é o sereno
rumor sem escrúpulos dos teus sapatos
rasos, que já não voltam. Que vitórias
quer quem ama? Porque são tão direitas
as ruas? Não olho para trás, mas
já não te sei perder de vista. Esta
é a terra do escárnio: os amigos dão
informações falsas. A minha boca
beija o que morre, e aceita-o e até a pele
do lábio é a do vento. Adeus. É útil,
normal este facto, dizem. Aceita
as nossas coisas, tu que podes tê-las.
Eu vou para onde me levar a noite.



claudio rodríguez
sem epitáfio
trad.miguel filipe mochila
língua morta
2019







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