I
Passo a minha mão pela tua cabeça,
recurvamente, atentamente, e só com dedos brandos,
olhando-a como passa e vendo onde passou.
Quero tanto saber o que tu pensas.
II
O que tu pensas, mas apenas como,
e quando e o porquê, e não
que estejas pensando ou não que a minha mão,
atenta e recurvada, passa brandamente.
Quero saber aquilo que nem sabes.
III
Aquilo que nem sabes – como saberias
o que o pensar é antes de pensar-se?
A mão que pousa e vai passar atenta.
O olhar que espera ver passar o gesto.
A tácita lembrança de volver os olhos.
A brisa que sabemos vai soprar tão mansa,
ainda antes, no fremir de pétalas ou folhas,
mas não na expectativa do arrepio prévio.
IV
Por que esperaste, ciente, a pele da minha mão?
jorge de sena
fidelidade (1958)
trinta anos de poesia
editorial inova
1972
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