Trocaram entre si a roupa
nos primeiros dias.
A T-shirt negra com os deuses astecas,
lembrança de um museu,
pelo pulôver fino e em bico
de listas amarelas com nervuras azuis.
O pólo anil gasto de há já cinco anos
pelo branco de seda, alado, com transparências,
de colarinho mole e grande.
Era como um abraço
apertado e ligeiro.
Acostumar a tua pele ao tacto da sua,
impô-lo ao sair, como uma carícia.
Ao descobrirem-se sós em encontros agridoces
com antigos amantes,
a doçura do outro soprava no tecido.
Ao descobrirem-se longe qual uma sombra débil
à beira das sombras,
o outro aparecia qual uma fortaleza.
Era a afirmação que sempre lhes faltava,
o toque permanente de alerta nos seus afectos.
E, isso sim, não escutaram
que ninguém lhes dissesse:
os fios da tarde tecem-se sem a tarde.
luis muñoz
poesia espanhola, anos 90
trad. joaquim manuel magalhães
relógio d´água
2000
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