08 abril 2018

camilo pessanha / ó cores virtuais que jazeis subterrâneas




Ó cores virtuais que jazeis subterrâneas,
– Fulgurações azuis, vermelhos de hemoptise,
Represados clarões, cromáticas vesânias – ,
No limbo onde esperais a luz que vos baptize,

As pálpebras cerrai, ansiosas não veleis.

Abortos que pendeis as frontes cor de cidra,
Tão graves de cismar, nos bocais dos museus,
E escutando o correr da água na clepsidra,
Vagamente sorris, resignados e ateus,

Cessai de cogitar, o abismo não sondeis.

Gemebundo arrulhar dos sonhos não sonhados,
Que toda a noite errais, doces almas penando,
E as asas lacerais na aresta dos telhados,
E no vento expirais em um queixume brando,

Adormecei. Não suspireis. Não respireis.


camilo pessanha
clepsidra
1920





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