Uma vez, um homem velho, sentado na erva,
esperava que o filho regressasse com o frango
mal esganado e pespegou-lhe duas bofetadas. Pelo caminho
– iam de madrugada por aqueles montes –
explicava-lhe que os frangos se esganam com a unha
– entre os dedos – do polegar, sem ruído.
Empanturrados de fruta, caminhavam debaixo das árvores
no fresco amanhecer e o rapaz levava
ao ombro uma cabaça amarelada. O velho
dizia que as dádivas da natureza são de quem delas precisa,
é tanto verdade que não nascem debaixo de telha. Primeiro olha-se
bem à volta e depois escolhe-se com calma a videira mais escura,
e sentamo-nos à sombra dela, sem bulir, enquanto não estivermos
atestados.
Na cidade há quem coma frangos. Nas ruas
não se encontram frangos. Encontra-se o velhote mirrado
– é tudo quanto resta do outro homem velho –
que, sentado à esquina, olha para quem passa
e, quem quer, lança-lhe duas moedas. Não abre a boca
o velhote: estar sempre a falar faz sede
e na cidade não há tonéis entornados,
nem em Outubro nem nunca. Há a grade do tasco
que cheira a mosto, especialmente à noite.
No Outono, à noite, o velhote caminha,
mas já não tem a cabaça, e as portas defumadas
dos tascos expelem bêbados que falam sozinhos.
É uma gente que só bebe à noite
(pensam nisso logo de manhã) e assim se embebeda.
O velhote, em rapaz, bebia com calma;
agora, só de o cheirar, treme-lhe a barba:
por fim, mete um pau entre os pés dum bêbado
e derruba-o. Ajuda-o a levantar-se, esvazia-lhe os bolsos
(ao bêbado às vezes resta-lhe qualquer coisa),
e às duas expulsam-no também a ele
do tasco cheio de fumo, pois canta, pois grita
e que quer a cabaça e deitar-se à sombra das videiras.
cesare pavese
cidade no campo
trabalhar cansa
trad.carlos leite
cotovia
1997