31 janeiro 2018

rui diniz / esboço





Sentados nas esplanadas da margem ouvíamos
o grito das civilizações. Havia semanas de silêncio
nas cidades litorais. Eu beberia entretanto cerveja
após cerveja e lia the Sun also rises. Que
mais escrevera este homem no seu solar
em Davim? Ninguém gostou de um poema que
que escrevi sobre o suave génio das gerações. E então
decidi partir para Bruxelas.

De todos os destinos o de Alice Toklas fora
o mais doloroso. Ela escrevera pacientemente
a biografia de todos os monges loucos e
por fim, enlouquecida pelos seus feitos, destruíra
os manuscritos enquanto dizia poemas de chaucer.

O seu olhar cintilava roxas estações, negros
campos de peste, livros e livros lidos pelas
insónias adiante.

E nós permanecemos sentados durante anos e
e anos nas esplanadas vazias, escrevendo loucamente
a incapacidade do tempo, a fúria dos dias e
das noites, a incansável desolação de cada palavra.

Repetimos o amor no interior das casas.
Recebemos um fulgor fácil das horas marítimas,
poemas vieram facilmente escritos aqui e ali.

Também da vida dissemos a alucinação exacta, os
motivos febris da inspiração, o ópio, o espaço
das flores de álcool, o olhar coincidindo
com a humilhação, os lábios distorcendo a mágoa
e a pouco e pouco já apenas o medo, o puro
medo de de repente em nós a voz se deteriorar.



rui diniz
ossuário
(ou: a vida de james whistler)
& etc
1977






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