a única, a última,
e pudesse depois ficar em silêncio para sempre…
Os meses sucedem-se, as estações acontecem e,
sem que sejam necessários milagres, cai sobre mim
a luz de Setembro, essa sombra que sou.
Vem uma flor, depois outra flor e as árvores,
como as nuvens, ao abrigo dos silêncios que subsistem
em certos vocábulos, como ruína, hesitação, relâmpago,
melancolia, acendem-se e mudam de cor.
Algures, cortam os campos ao milho, seca-se e extrai-se
a eira da vagem do feijão, sobem-se as vindimas até ao desvão
do mosto e ainda no sismo da vertigem que é a infância
alguém descobre ou perde um templo feito de sol.
Dou um passo e mais um passo. Descalça, sempre
descalça, faça chuva ou esteja calor, que Setembro é
um mês de incertezas, para que me doam menos
os trilhos e as trevas dos desencontros e os mistérios
que poderiam ter ocorrido junto ao mar.
de verso em verso, saio porta fora, no rasto da última
luz de Setembro, essa sombra que sou, como se procurasse
a definitiva palavra de um poema de Vergílio Ferreira e
assim rompesse o lado mais impuro das candeias.
A sequência é simples. Acrescento amor às sombras
que ficarão para sempre.
manual da vida breve
poesia reunida 2003-2021
officium lectionis edições
2021