28 julho 2022

antónio manuel couto viana / café de subúrbio

  
2.
Choram para o chão os guarda-chuvas.
Chove e faz frio. O café está cheio.
Lento, descalço as luvas,
Pego num livro e leio.
 
É um livro de antiquada poesia:
Uns versos démodés, de um dandismo epocal,
Certa melancolia
E um satanismo gris de Flores do Mal.
 
(Café parisiense. Século XIX.
O absinto e a lavalliére.
Lá fora, como agora, chove, chove…
Ai, com que sugestões a inspiração me fere!)
 
Jovem, alguém, na mesa ao lado,
Espia-me a leitura, num sorriso de dó.
E fecho o livro, desencantado,
Com os olhos e os dedos já manchados de pó.
 
 
 
antónio manuel couto viana
as escadas não têm degraus 4
livros cotovia
janeiro 1991





 
 

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