Um homem que dorme tem em círculo à sua volta o fio
das horas, a ordem dos anos e dos mundos. Consulta-os instintivamente ao
acordar e neles lê num segundo o ponto da terra que ocupa, o tempo que decorreu
até ao seu despertar; mas as respectivas linhas podem misturar-se, quebrar-se. Basta
que, já de manhã, depois de uma insónia qualquer, o sono o invada enquanto lê,
numa posição muito diferente daquela em que habitualmente dorme, basta que
tenha o braço levantado para deter e fazer recuar o sol, e ao primeiro minuto
depois de acordar já não saberá que horas são, julgará que mal acaba de se
deitar.
marcel
proust
em busca do
tempo perdido
volume I do
lado de swann
trad. pedro tamen
relógio d´água
2003
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