29 novembro 2018

vasco graça moura / luz




à noite quando alfama se calou
e já não há ninguém pela calçada
ficamos presos entre o que te dou
e o que me dás a mim na madrugada

em corpo e alma somos roda-viva
de afagos tão suaves, tão urgentes,
de bocas, línguas, dentes e saliva,
e das aparições impacientes

depois vem o cansaço que se embala
num leve sussurrar só de ternura
como as naus que baloiçam numa escala
onde as levaram brisas de aventura

e ao fim da noite vemos no postigo
que entretanto nasceu a estrela de alva
um arco-íris serve-nos de abrigo
e o céu é cor de rosa e cor de malva

e se alta madrugada assim nos demos,
no mais fundo de nós era preciso
também esse sinal de que pusemos
na própria entrega a luz do paraíso



vasco graça moura
a puxar ao sentimento
quetzal
2018







1 comentário:

Ulisses de Carvalho disse...

Bonito o poema, cria-nos imagens grandiosas.