Meu amor,
a casa está tão sozinha que
os pássaros vêm morrer lá dentro.
Nada mudou, mas falta
a mão para acariciar o gato
e acolher a ninhada secreta,
o sorriso que enchia o tanque
e fazia crescer a horta.
Já ninguém apanha as laranjas mais altas
ou usa a sombra da nogueira.
E até os ciprestes se tornaram redundantes
ao ponto de os abatermos:
a ausência diz-se melhor no esplendor
inútil das rosas sem esse olhar,
nas papoilas raras que duram
o tempo de uma fotografia.
Um dia, deixaremos também uma casa assim,
casulo abandonado a sobreviver-nos.
Um de nós escutará as asas ansiosas
na chaminé, antes de pousar o livro
e amparar o último pássaro.
Só parecerá menos triste
porque não teremos, então,
nada mais a perder.
inês dias
resumo, a poesia em 2011
documenta
2012
1 comentário:
Cada vez que leio algum poema da poetisa Inês Dias sinto a intensidade de cada palavra escrita. Foi um prazer ter sido sua aluna.
E deixo um pequeno contributo para si que me aguçou o gosto pela poesia, pela língua portuguesa e o mais importante para mim transformar cada objectivo numa meta traçando um caminho para chegarmos até ela ... E nunca deixar de acreditar que a conseguimos alcançar...
Preamar
Como é bom sentir a maresia
o espírito eleva-se a um nível
que presencia, o nirvana.
Com a certeza de que a terra é redonda
mas o mar cruza-se com o céu numa onda ..
Que me faz sonhar e sentir viva,
sinto-me resgatada pela vida,
já fui tida e achei-me.
No caminho mais improvável
de ser o correcto
sem ser sequer concreto
mantenho-me no momento exacto
mas parece abstrato ...
Sinto o meu ser persuadido
por vontades contraditórias
memórias passadas
em brumas de histórias contadas
com o meu ar incrédulo
acredito em tudo o que vejo porque
os ouvidos não escutam coração que fala..
São apenas sentimentos não sedimentados.
Momentos atribulados que vivi
e ainda não esqueci,
porque fazem parte de mim.
Eu sou um pouco de ti
Tu és um pouco e mim
somos um pouco do mundo
que nos rodeia enfim..
Realidades distintas
que se conjugam na perfeição
sem ser com pincéis
canetas ou papéis
fizemos arte acontecer
entreguei-me sem te ter ..
Sem saber sequer
quanto valho, falho
com uma sobriedade notável.
De quem está a praticar
um acto
insano,
profano,
mas não derramo
arrependimento fingido.
Tudo acontece por um motivo ..
Um beijo
Raquel Velho (da LAV)
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