o amor é uma luz
a correr de noite pelo nevoeiro
o amor é uma carica de cerveja
pisada a caminho
da casa de banho
o amor é a chave de casa perdida
quando estás bêbado
o amor é o que acontece
uma vez a cada dez anos
o amor é um gato esmagado
o amor é o velho ardina
na esquina
que já desistiu
o amor é o que tu pensas que a outra
pessoa destruiu
o amor é o que desapareceu
na época dos vasos de guerra
o amor é o telefone a tocar
a mesma voz ou outra voz
mas nunca a voz
certa
o amor é traição
o amor é a incineração
de vagabundos num beco
o amor é ferro
o amor é a barata
o amor é a caixa de correio
o amor é a chuva no telhado
de um velho hotel
em Los Angeles
o amor é o meu pai num caixão
(o teu pai que te odiava)
o amor é um cavalo com uma pata
partida
a tentar levantar-se
perante uma assistência
de 45 000 pessoas
o amor é o modo como fervemos
como a lagosta
o amor é tudo aquilo que dissemos
que não era
o amor é a pulga que não consegues
encontrar
e o amor é uma melga
o amor são 50 granadeiros
o amor é uma arrastadeira
vazia
o amor é um banco de bar vazio
o amor é um filme do desastre de Hindenburg
a encarquilhar aos pedaços
um momento que ainda grita
o amor é Dostoiévski diante
da roleta
o amor é o que rasteja
pelo chão
o amor é a tua mulher a dançar
nos braços de um estranho
o amor é uma velha
a roubar um pedaço de
pão
e o amor é uma palavra
usada demasiadas vezes e
demasiado
cedo.
charles bukowsky
os cães ladram facas
trad. rosalina marshall
alfaguara
2018