14 dezembro 2024

manuel antónio pina / passagem

 
 
 
                                                                À Inês



 
Com que palavras ou que lábios
é possível estar assim tão perto do fogo,
e tão perto de cada dia, das horas tumultuosas e serenas,
tão sem peso por cima do pensamento?
 
Pode bem acontecer que exista tudo e isto também,
e não só uma voz de ninguém.
Onde, porém? Em que lugares reias,
tão perto que as palavras são de mais?
 
Agora que os deuses partiram,
e estamos, se possível, ainda mais sós,
sem forma e vazios, inocentes de nós,
como diremos ainda margens e como diremos rios?
 
 
 
manuel antónio pina
amigos e outras moradas
todas as palavras, poesia reunida
assírio & alvim
2012
 




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