13 dezembro 2024

miguel serras pereira / levíssima demora

 



 

 

Deixo aqui a estrela semeada para te dar
nas areias de uma noite de passagem
numa carta de amor de novo em branco
a meio das outras cartas que no escuro
despertam no meu pulso enquanto escuto
ou a manhã adormece intermitente
na extrema vigília das mãos nuas
 
Apoio as costas contra o velho muro
por onde agora chegas e atravessas
as passagens secretas sob a pele
o imenso olhar dos campos desdobrados
brilhantes de brancura à transparência
do sangue da loucura
 
Deito ao vento o que resta do meu rosto
para quando o vento vier amar a sós
no voo dos teus ombros ainda aureolados
pela levíssima demora destas horas
subindo ao teu encontro a antiga atmosfera
onde pássaro a pássaro hoje se desprende
do silêncio do tempo a música das esferas
 
O adeus começa a passo de lobo na cintura
perdido no caminho do regresso
Alta queda de tudo para tudo
quando tudo de novo flutua
à deriva dos astros entre as ilhas penduradas
por cada passo teu nos mastros deste barco
que acorda a travessia no deserto
e traz a bordo o mar para nos levar
 
 
 
miguel serras pereira
trinta embarcações para regressar devagar
relógio d´água
1993
 


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