A moral ainda se defendia. Proibia o espírito de se
vergar às finalidades. Votando-o ao desapego como à nudez, ela afastava dele os
projectos que lhe determinariam um futuro a curto prazo, ela despia-o das
formas às quais ele se prestava (vistos de cima, todos os domínios do espírito
se fundem). O seu exercício, em regime de pura perda, era uma observância e uma
distracção. Vendido por seus irmãos, ela devolvia-o a si mesmo.
É então que ele dá livre curso ao seu poder. Ignora
qualquer duração que se apague para o deixar passar. Já nada espera das suas
próprias palavras que espalha como rosas e adagas pelos espasmos do vento. E erupção
da sua vida transcende qualquer preocupação e a defesa moral cai como uma
barricada estiolada. Já não existe para ele nenhum ponto de referência, nenhum
problema moral se lhe coloca. Os polvos de referência adormecem no riacho das
suas artérias.
francis gérard
sonhador definitivo e perpétua
insónia
uma antologia de poemas
surrealistas escritos em língua
francesa
trad. regina guimarães
contracapa
2021
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