Com que gramática se escreve? A
de um luar antigo, por onde
voaram
as aves nocturnas em busca
de alvorada? A de uma sintaxe matinal,
emprestando ao verso o soletrar
luminoso das vogais? Ou a dessa tarde
que deixou nos lábios o sabor
de palavras secas como as folhas
de outono?
Aprendi essas gramáticas nos
compêndios da imaginação; decorei
as suas regras com o fervor obscuro
das mnemónicas doentes; repeti
os seus exemplos em estrofes
vazias como as caixas amontoadas
num sótão de infância.
“Terá valido a pena esse
trabalho?”, perguntas-me. De facto,
não sei que resposta te poderei
dar. Os livros – arrumados nesse
canto do infinito em que nunca
nos havemos de encontrar; as frases,
sem ligação, como se a vida
as tivesse desfeito no moinho
da eternidade.
Então, pergunto eu: de que corpo
és a sombra sem rosto, o pulso
sem emoção, a queixa sem a música
de um murmúrio?
nuno júdice
a fonte da vida
quetzal
1997
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