26 maio 2008

pela tua natureza discorro




Como renasces ao amar. Que corpo te possui? Dimanam (crescem) de ti forças que ignoro ao transtornar-te, ao abateres nesta ondulação envolvente que é o acto de amarmos, uma guilhotina ascendente partindo do corpo para o espaço, contrariando a gravidade e por isso mesmo fixar-se como um olho severo e ciclópico, um sexo assexuado, pénis-vagina, hermafrodita florestal, animal vegetal, a longa experiência dos equinodermes, a solidão dos ciclóstomos, os primitivos placentários de corpo minúsculo.

Mas que imensidão quando emerge nos teus olhos esta recriação do procriar, a grandeza do prazer, a ferocidade da morte-viva, a imitação da vida, o desflorar da atmosfera dos pulmões que nos respiram, o sorvo cataléptico do teu orgasmo plasmado no meu, trevas e luzes que escorrem em denso liquido, um sangue contaminado e bebível no seu jorro ovariano, uma natureza que se contraria pura para te ter, agarrar com dedos enclavinhados os tecidos mais secretos do teu ser, fundir a matéria espermática do que sou e, construção escultórica de mãos, explodir no magma, crestar para enobrecer enobrecido, dissolver os contornos, transcender seus átomos.

Madrid, Janeiro de 1972







carlos eurico da costa
colóquio letras nr. 12
março 1973
fundação calouste gulbenkian
1973




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