A pouco e pouco o dilúvio entrou e fechou a porta atrás de si
A dor que hesitara entre o corpo e o espírito
pousou os cabelos na fronte e deixou-se ir com o dilúvio
Já dormiu nos pátios, uma fresta de muro (mundo) íngreme
era a sua fascinação nocturna
O impossível avançou para ele e passado ficou
cheio de partes dispersas e o princípio de um ventre mosaico
no vitral da sala
As imagens levam em si memórias silenciosas
em troca de um pântano entontecido, uma mistura açucarada
que já ninguém lembra entoando cânticos antigos
e estendendo os braços extinguem a luz
Reflectia, sentia, verticalmente repuxado pelos planos que
antes encenara, empurrando para a frente
o tecto do corpo longo de um riso quadriculado
manhãs ínfimas da extremidade de troncos humanos
procuram na quebra dos braços a transpiração de outras
mãos
sobre as suas, oferecem-se à ternura dos
tormentos misteriosos e aí permanecem
vestem cinza sóbrio e elegante: casaco cinza,
calça cinza, gravata cinza
Formam uma mancha cinza na obscuridade
constroem
uma rua baça e escura com escadas de latão grosseiro, onde
um degrau leva as mãos amarradas por ser um degrau solitário
no início de uma tarde de Inverno
por detrás de cada silêncio nasce um homem
de pés descalços e traz um som áspero que se renova
ciclicamente
A muralha vai
de um
ao outro extremo da terra
ângela canez
oficina de poesia
nr. 3 Junho 2004
coimbra
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