I
Chega a
primavera com as folhas
Desavindas, o
céu desatrelado invade
Trincheiras e
monturos, aqui tu não vens,
Fechas os olhos
para impedir
O peso do horizonte,
o odor
Dos corpos que
já não cantam,
Das mãos que
pacíficas ainda
Trazem um
pequeno lume, mas tu
Não vês, são
pedaços reluzentes,
Montículos de
mica sem boca e rosto.
Quando tudo
terminar, mas nada termina
De verdade, sob
O silêncio
destas ruas ficarão
Os nossos
sonhos – e não voltes a falar
Do mar, nem das
nuvens harmoniosas,
Porque a morte
não é um vago vocábulo.
II
O teu corpo
assim-sim
É uma galáxia
compacta, sem saída
Ou entrada, uma
espécie
De paisagem do
que ficou,
Do que vai
ficando
Do clamor das
matinas.
És inteiro em
partes iguais,
Como quem parte
e reparte
E perde a
melhor parte, e remendas
O erro com
outro erro,
O teu mínimo de
existência.
III
O que resta dos
dias pardos
Vem bater à tua
porta,
Qual mão
espectral do destino.
A copiosa
escuridão mete-se
A caminho,
importuna a clareza do verso.
Sob o detrito
da língua
Faísca o fio da
espada.
IV
Um coração
fechado só abre feridas.
Afinal do que
falas?
O que dizes p’lo
que fica
Por dizer?
Éramos muito
jovens e a vida
Ainda nos
desejava
Com muitas
madrugadas e
A floração do
desejo nas crinas
Marítimas – uma
constelação inteira
A colapsar
sobre nós.
Nenhuma memória
é residência fiável.
Afinal, do que
falas então?
fernando luís sampaio
nervo/24
colectivo de poesia
maio/agosto
2025
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