326 – Não o perguntes. Basta pensar no que se
perdeu não de há muito tempo até hoje. Ídolos das artes e letras, do futebol,
da política, do que parecia bem ou mal. Tens razão, agora é diferente. Porque o
que se sente no vento, o que se percebe na voz inaudível de um incerto aviso de
morte não tem que ver com o mais e o menos, o que sobra do que se eliminou, mas
com tudo o que se imaginou de toda a ordem da vida. Um homem novo está a nascer
e não traz sinais do nosso sangue, do modo de se ser humano como limite de tudo
o que se precisa imaginar. Será possível conceber-se um ser humano que nada
tenha a ver com o ser-se homem? Um homem que se reconheça numa ordem de ser
pensante e sensível? Hoje já não precisa de saber a tabuada para fazer contas,
de saber ler e escrever para existir o livro e a carta, de haver amor ou
simples atracção para produzir humanidade, de quaisquer regras para a
consciência existir, se saber o que é isso de consciência para haver culpa ou
remorso. O que se segue é ininteligível para um modo de haver entendimento das
coisas. O que se segue começa no nada e o nada é impensável. Pois. Mas não te
faças perguntas sobre um nada a começar. E acaba tu nos limites do que te foi
pensar e sentir o justo e o injusto e tudo o mais que te ordenou o seres
vivente na ordenação de tudo o que te coube. Porque amanhã nada te existe e o
mundo terá portanto acabado. Não te canses a perguntar. E sê inteiro para
quando a morte chegar cumprir o seu dever e tu o teu para não chegar em vão.
vergílio
ferreira
escrever
edição de helder godinho
bertrand editora
2001
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2001
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