20 março 2020

nuno júdice / acalmia



O vento sopra no vazio da pele,
quando a abandona o desejo; levanta
as palavras caídas, ergue-as
até às nuvens, onde as vejo misturarem-se
com as aves embranquecidas do ocaso.

O vento deita-se nas equimoses do espírito,
abrandando a dor de quem ama sem
objecto nem eco. Ouço-o por dentro das veias
rápidas de um luxo de emoções, como
se gritasse por um tropel de troncos.

O vento morre nos braços de florestas
petrificadas, saudando um degelo de re-
soluções. Respiro o ar imóvel com um odor
de folhas calcinadas – como se pisasse o teu
corpo, terra lívida do meu abraço.




nuno júdice
a fonte da vida
quetzal
1997





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