11 dezembro 2021

jorge roque / um exemplar falhado da espécie

 
 
I
Fascinados pela possibilidade alimentar que o extraordinário progresso criou, os povos desenvolvidos, organizados em estados, governados pela economia, administrada por uns quantos que com ela lucram, acomodam-se de boca cheia à condição de animal de criação na empresa desses quantos, cujo negócio é precisamente a classe privilegiada de que fazem parte. E se isto custa a perceber, tão perversa é esta aliança entre exploração e privilégio, o pior, está bom de ver, é o mais mau. Quero dizer: a janela que abriste, não mais poderás fechar. O frio que por ela entra é sem regresso. O homem que nesse desabrigo se ergue, não há casaco que o vista. Ínfimo diante da força surda do mundo, é nu que treme, nu que sofre, nu que desesperado grita. E nu, por fim, que morrerá sem alcançar a razão do seu grito. Lembrando o comentário do meu vizinho de baixo, proferido a respeito de pessoa alheia, mas curvado à verdade triste de ele mesmo ser um deles: coitado!



jorge roque
ladrador
averno
2012




 

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