22 outubro 2016

carlos edmundo de ory / suspeitando dos meus dedos



Cai rápido em minha alma
o desejo de morrer
de infundir calma
no meu espantoso ofício de escrever
para pôr em som o quanto calo
e a quem não responde perguntar
Com o sangue de Deus na crista
eu sei que sou um galo

Esta é a minha mão das palavras
Sua-me em português a mão
Já me sangra de golpear em vão
Meter alguém as cabras
no curral por ser humano
de uma só mão

Se fosse mudo gritaria
mudo de espanto
Já me não resta pranto
nesta mão  minha
E se quer alguém o meu ofício
de mutismo e grito
que me arranque pela raiz
Deus e a caneta que é o mesmo

Deixaram-me ferido
os cantos e os credos
Agonizo aqui limpo de pecado
muito amei e chorei demasiado
suspeitando dos meus dedos


carlos edmundo de ory
doze nós numa corda
poemas mudados para português
por herberto helder
assírio & alvim
1997





1 comentário:

Unknown disse...

Gostei muito do blog!
Retribua a visita, talvez goste
http://letraseopiniao.blogspot.com.br/
Só um trecho

"Compreendi que não nasci pra grandes coisas;
Eu não serei Rei,
não serei pisoteado afim de me tornar um bom vinho
não carrego os genes de Napoleão, Dostoiévski
nem mesmo de uma puta que fora assassinada num beco escuro
e que, por esta razão, estampou, por um tempo,
as primeiras páginas dos jornais."

Sempre me inspiro nas poesias alheias, vá e lá arranque o que puder

Obrigado