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25 setembro 2021

pedro loureiro / há uma voz que nunca fala

 



 
há uma voz que nunca fala
uma voz de segredo
que no calor da ferida hiberna
rasgam-lhe o corpo
e somente brota um rumor
eco de um grito
é obstinada esta voz
sem nenhum ouvido
que a consiga parar
e o segredo cresce, denso
por trás da tela de projecção
enquanto a falsa moeda
inunda demasiadas bocas
a inviabilizar o repouso
em ritual de oposição
à pureza de um fogo
que incendeia
que consome
que ultrapassa
a hipotermia cerebral
das gentes contínuas
 
 
 
 
pedro loureiro
negro silêncio
(uma série a partir da obra de Rui Chafes)
editora urutau
2020





18 junho 2020

pedro loureiro / eu juro que não escolhi isto



Eu juro que não escolhi isto
esforcei-me por escapar
pelo friso do cordão umbilical
mas logo me colocaste o ébrio guizo
e este tinido incessante
calcifica tudo
até à transmutação da gola em redondel
portas chapeadas que cercam
o lusitano em corrida
a sacudir hipóteses e argumentos da crina
sempre em revolteio
é tão difícil ter-me de quatro
a mão que na superfície de uma janela toca o mundo
já recebeu a Grã Ordem de Marcha
e as mais altas condecorações
pela bravura do estupro
por isso, não
não me prometas nada
antes que o galo cante
negar-me-às n vezes



pedro loureiro
that´s all folks
editora urutau
2018





16 fevereiro 2019

pedro loureiro / não há absolvição







Não há absolvição
apenas a ilusão de um recomeço
a subversão do ontem
perfídia disfarçada
urdindo formações de desalojados
saciando a abstinência virulenta
cabeças que cortam cabeças
matilhas de pássaros orgânicos
causando a obstipação dos profetas



pedro loureiro
astigmatismo ou redenção
ilustrações inma serrano & josé louro
editora urutau
2019






07 outubro 2018

pedro loureiro / máscara





Olha como dançam
e são mais do que o rosto
como renascem os mortos neles
pele, ossos e penas
mandíbulas que se mexem
num ritual de misterioso poder
espectros, pesadelos
de acentuados e expressivos traços
ridículos nos seus disfarces
rostos extremamente longos e testas amplas
sóbrias no seu poder
olhos redondos em alerta ou fúria
nariz adunco de quem não se quer render
ser outro ou a máscara dentro da máscara
grotesco e monstruoso
de proporções exagerado
ser poema, bobo ou marioneta
alvo ou enegrecido
abstracto deus esculpido
e cornos, muitos cornos
nas cabeças gigantescas
que vestem o rosto dos mortos
mantém pois teu peito aberto
à mais pequena máscara do mundo
o rubro e esférico nariz de palhaço




pedro loureiro
that´s all folks
editora urutau
2018