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12 outubro 2023

mark strand / os restos





 

 

                               Para Bill e Sandy Bailey
 
 
 
 
Esvazio-me dos nomes dos outros. Esvazio os meus bolsos.
Esvazio os meus sapatos e largo-os à beira do caminho.
À noite faço retroceder os relógios;
Abro o álbum de família e vejo como era em rapaz.
 
O que gano com isto? As horas fizeram o seu trabalho.
Digo o meu próprio nome. Digo: adeus.
As palavras seguem-se umas às outras seguindo vento.
Amo a minha mulher mas mando-a embora.
 
Os meus pais deslocam-se dos seus tronos
para dentro dos quartos leitosos das nuvens. Como posso cantar?
O tempo diz-me o que sou. Mudo e sou o mesmo.
Esvazio-me da minha vida e a minha vida é o que me resta.
 
 
 
mark strand
o universo está pintado à mão
uma antologia fanática
luís filipe parrado
língua morta
2020
 





 

08 dezembro 2011

mark strand / elegia 1969




                               segundo carlos drummond de andrade


  

Arrastas a escravidão até à velhice
e nada que faças te vale de muito.
Dia após dia passas pelos mesmos gestos
tremes na cama, tens fome, desejas uma mulher.

Heróis representando vidas de sacrifício e obediência
enchem os parques por onde caminhas.
À noite, no nevoeiro, abrem as umbrelas de bronze
ou então refugiam-se nos vestíbulos vazios dos cinemas.

Amas a noite pelo seu poder de destruição,
mas enquanto dormes, os teus problemas irão morrer.
Acordar só prova a existência da Grande Máquina
e a luz árdua cai nos teus ombros.

Caminhas entre os mortos e falas
de tempos por vir a assuntos do espírito.
A literatura fez-te desperdiçar as melhores horas de amor.
Fins-de-semana perdidos, a limpar a casa.

De pronto confessas o teu fracasso e adias
a alegria colectiva para o próximo século. Aceitas
a chuva, a guerra, o desemprego e a distribuição injusta da riqueza
porque não podes, sozinho, rebentar a ilha de Manhattan.




mark strand
trad josé alberto oliveira
rosa do mundo
2001 poemas para o futuro
assírio & alvim
2001




17 fevereiro 2011

mark strand / elegia 1969


segundo carlos drummond de andrade




Arrastas a escravidão até à velhice
e nada que faças te vale de muito.
Dia após dia passas pelos mesmos gestos,
tremes na cama, tens fome, desejas uma mulher.

Heróis representando vidas de sacrifício e obediência
enchem os parques por onde caminhas.
À noite, no nevoeiro, abrem as umbrelas de bronze
ou então refugiam-se nos vestíbulos vazios dos cinemas.

Amas a noite pelo seu poder de destruição,
mas enquanto dormes, os teus problemas irão morrer.
Acordar só prova a existência da Grande Máquina
e a luz árdua cai nos teus ombros.

Caminhas entre os mortos e falas
de tempos por vir a assuntos do espírito.
A literatura fez-te desperdiçar as melhores horas de amor.
Fins-de-semana perdidos, a limpar a casa.

De pronto confessas o teu fracasso e adias
a alegria colectiva para o próximo século. Aceitas
a chuva, a guerra, o desemprego e a distribuição injusta da riqueza
porque não podes, sozinho, rebentar a ilha de Manhattan.







mark strand
rosa do mundo 2001 poemas para o futuro
trad. josé alberto oliveira
porto 2001 / assírio & alvim
2001