24 fevereiro 2021

arthur rimbaud / a minha boémia

 (Devaneio)
 
 
Assim ia eu, com os punhos nos bolsos rotos;
E o meu casaco que também se tornara ideal;
A cabeça descoberta, Musa!, e a ti sempre fiel;
Ah! Com que esplêndidos amores não sonhei!
 
As minhas únicas calças tinham um enorme buraco.
– Polegarzinho sonhador, pelos caminhos desfiava
As minhas rimas. O meu albergue era a Ursa Maior.
– As minhas estrelas faziam no céu um suave frufru.
 
Ficava a ouvi-las, sentado à beira dos caminhos,
Nessas belas noites de Setembro em que sentia no rosto
Como um vinho retemperante, as gotas do orvalho;
 
Quando, rimando no meio das sombras fantásticas,
Como as cordas de uma lira, puxava os atacadores
Dos meus sapatos feridos, um pé junto do coração!
 
 
 
jean-arthur rimbaud
poesia
obra completa
trad. miguel serras pereira e joão moita
relógio d´água
2018





 

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