17 setembro 2018

joaquim manuel magalhães / ancoradouro




Às vezes acordamos felizes. A casa
está sossegada, o quarto
dá para um jardim com as cantarias
caídas e árvores altas e muros de musgo.
O burel das cortinas antepara o céu
opaco sobre prédios urbanos.
O universo, submisso, parece disposto
para proteger; acolhe na manhã
as fachadas com os andares de três janelas,
de duas, de uma apenas; termina
em triângulos difusos na neblina.
O aquecimento irradia dos tubos, a chuva
acaricia os barcos parados, um homem com vara
debruça-se para retirar detritos.
Bandos de pássaros, brandos ventos, tudo pousado.
Abro a blindagem do quarto e ouço
os tijolos, a tinta, as escadas, o corrimão
a sangrar.



joaquim manuel magalhães
sloten
livro de artistas
europalia 91
1991






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