I
O termo que eu temo
Em mim estremece.
Não é o que passa
Nem aquilo que esquece
Que o meu ser receia
É antes
Essa dor contínua
Que de si mesma se torna cadeia.
Se alguma dor existe
Que o termo não atinja,
Não existe porém termo algum
Que a própria dor não finja:
Sentes? Mentes.
Sabes? Não vês.
Quando descobres, passaste
Quando interpretas
Esqueces.
II
A senda que eu sigo
É a meta que atinjo.
Partindo, regresso
E regresso avançando.
Temendo é que eu venço.
Chorando, me alegro
E sofrendo, embeleço
Entendendo a ordem
Oculta e evidente:
Ou amo e morro
Ou vivo e não amo.
III
As lágrimas que dos meus olhos caem
São o teu pranto em mim realizado.
As tuas penas em mim se vivificam
E o teu sofrer em mim encontra forma.
O teu silêncio é a minha voz mais funda,
O teu querer, a minha esperança intensa,
De sorte que não existe morte
Tua que a mim me não pertença.
E a solidão que de alma a alma aumenta
O anseio do encontro antigo,
É a inarmonia que vive
Da diferença que a desunião gera.
Reúne-te comigo no meu chamamento,
Reúne-te comigo ao que nos demora,
E levemos connosco o fim desta espera!
ana hatherly
poesia
1958-1978
moraes editores
1980
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