o amor não somos nós que o temos
é-nos dado
muito antes de termos nascido
talvez verdadeiro autêntico
como o encontro do mar e da luz
depois muito depois
quando os teus braços os teus
seios
chegaram até mim
já estavam perdidos
já não existiam
o meu rosto deformado atroz
já não te podia olhar
mas os meus olhos esses sim
ainda te viam como antes
como tu eras quando não existias
só os meus olhos
só os meus olhos
as mãos essas sem dedos
esfoladas esfaceladas
de tanto esperar
nunca te encontraram
w na grande planície do medo
ficavas tu que não existias
o meu corpo belo perdido
sem rosto muito pálido
partiu então
entre a nuvem e a sombra
maravilha de verdade
mas perdido na praia do sonho
embalado em algas
com muitos animais marinhos no sexo
com um rasto de luas
que sempre sempre
o acompanharão
apenas duas gotas de sangue
pequenas rutilantes
os meus olhos os meus olhos
sempre os meus olhos
mário-henrique leiria
a única real tradição viva
antologia da poesia surrealista
portuguesa
perfecto e. cuadrado
assírio & alvim
1998
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