23 agosto 2012

felipe benitez reyes / esboço na água





Sabes bem que estes anos passarão,
que tudo acabará em literatura:
a imagem das noites, a lenda
da triunfante juventude e as cidades
vividas como corpos.


Que estes anos
passarão já o sabes, pois são teus
como posse de neve e neblina,
como do oceano é a bruma, ou é do ar
a cor fugitiva da tarde,
coisas de ninguém e do nada
surgidas, que ao nada vão:
nem o oceano, nem o ar, nem essa bruma,
nem um crepúsculo igual verão os teus olhos.


A memória é um desenho na água
e nas suas ondas revela-se o cadáver do tempo.

Farás esse desenho.

E de súbito
terás a sombra morta
do tempo junto de ti.





felipe benitez reyes
espanha
tradução de manuel rodrigues


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