Estou a ouvir música.
Debussy usa as espumas do mar a morrer na areia,
refluindo e fluindo.
Bach é matemático.
Mozart é o divino impessoal.
Chopin conta a sua vida mais íntima.
Schoenberg, através de seu eu, atinge o clássico eu de todo o mundo.
Beethoven é a emulsão humana em tempestade
procurando o divino
e só o alcançando na morte.
Quanto a mim,
que não peço música,
só chego ao limiar da palavra nova.
Sem coragem de a expor.
O meu vocabulário é triste
e às vezes wagneriano-polifônico-paranóico.
Escrevo muito simples e muito nu.
Por isso fere.
Sou uma paisagem cinzenta e azul.
Elevo-me na fonte seca e na luz fria.
clarice lispector
um sopro de vida: pulsações
ed. francisco alves
rio de janeiro
1991
3 comentários:
Muito bonito
obrigada por este.
A Clarice é visceral. As poesias dela desnudam sentimentos. Há sempre um verso para um momento nosso. Há sempre uma tristeza para um verso de Clarice. Maravilhosa!
Parabéns pela escolha.
Ayan
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