17 fevereiro 2025

manuel de freitas / such a sad machine





 

 
                    no Estádio, com o Diogo Vaz Pinto
 
 
                         
Talvez hoje, de certa maneira,
tenha percebido. Há uma idade
em que acreditamos na poesia,
em que julgamos (coitados
de nós) a única saída possível.
 
Tocar na capa de um livro ou
numa «suffering jukebox»
torna-se quase a mesma coisa.
O mundo pede-nos desespero
– e nós tentamos dar-lho.
 
Há uma idade, um desencontro,
um fim sem recomeço que teima
em nomear mortos impartilháveis,
versos longos que celebram o luto
de haver versos, de haver morte.
 
Mas já não é a idade certa, aquela
em que tolerávamos poetas
e poemas que cresceram ao contrário,
por nos ser mais próximo o final da noite,
essa morte retórica que nos embebedava tanto.
 
Não sabíamos, mas acreditávamos
– na poesia ou noutra merda qualquer
que não viesse sujar o azul das mesas,
esta cor baça que persiste e que
fomos, de comum acordo, dissipando.
 
Uma idade em que nos apetecia ainda
falar de idade, sem futuro nem constrangimentos.
(Deixa-me ao menos pagar-te a cerveja.
Começou a chover. É demasiado tarde
para quem nunca esteve aqui
 
e espera, sentado, que lhe digam que morreu.)
 
 
 
manuel de freitas
telhados de vidro/12
averno
2009






 

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