O dia dizia: «Tudo o que sofre me acompanha, agarra-se
a mim, quer ser feliz. Testemunhas da minha comédia, segurai meu pé alegre. Receio
o meio-dia e a sua seta merecida. Não há nada que nos favoreça aos seus olhos. Se
o meu desaparecimento anunciar a vossa grandeza, as águas frias do Verão apenas
me hão-de receber melhor.»
A noite dizia: «Os que me ofendem morrem jovens. Como
não os amar? Pradaria de todos os meus instantes, não podem pisar-me. A sua
viagem é a minha viagem e eu permaneço obscuridade.»
Havia entre os dois um mal que os despedaçava. O vento
ia de um ao outro; o vento ou nada, as fraldas do rude estofo e a avalanche das
montanhas, ou nada.
rené char
furor e mistério
trad. margarida vale de gato
relógio de água
2000
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