Mostrar mensagens com a etiqueta pierre louÿs. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta pierre louÿs. Mostrar todas as mensagens

29 março 2022

pierre louÿs / o tempo ido que teima em ficar

 
 
LVII
 
Deixarei a cama tal como ela a deixou, desfeita
e em desalinho, os lençóis entrançados num só,
para que a forma do seu corpo continue impressa
ao lado do meu.
 
Até amanhã não irei ao banho, não me vestirei,
nem pentearei o meu cabelo, com medo
de apagar-lhe as carícias.
 
Não comerei esta manhã, nem mesmo à tarde;
não porei carmim nem pó nos lábios,
para que o seu beijo permaneça.
 
Deixarei as portadas das janelas fechadas
e não abrirei a porta, não vá a lembrança
latente partir com o vento que passasse.
 
 
pierre louÿs
o sexo de ler de bilitis
elegias em mitilene
trad. maria gabriel llansol
relógio d´água
2010




30 dezembro 2021

pierre louÿs / uma noite à lareira

 
 
LXXXII
 
É duro o inverno, Mnasídica. Salvo na cama,
o frio é omnipresente. Apesar de tudo, levanta-te, vem comigo,
porque acendi um lume farto com achas e raízes mortas.
 
Completamente nuas, aquecer-nos-emos agachadas,
os cabelos soltos pelas costas, e beberemos leite
pela mesma taça e comeremos bolinhos de mel.
 
É espantoso como as chamas são sonoras e alegres.
Não estás demasiado perto? Tua pele tornou-se vermelha.
Deixa-me beijá-la onde o calor a fez escaldante.
 
Nos tições ardentes, vou aquecer o ferro
e pentear-te diante do lume. Com o carvão que restar
entre as cinzas, escreverei teu nome na parede.
 
 
 
pierre louÿs
o sexo de ler de bilitis
bucólicas em panfília
trad. maria gabriel llansol
relógio d´água
2010




08 setembro 2021

pierre louÿs / a chuva

 
IX
 
Uma chuva miudinha embebeu tudo,
com muita doçura e em silêncio. Ainda chove um pouco.
Vou sair. Abrigar-me sob as árvores. Descalça.,
para não sujar os sapatos.
 
Na primavera, a chuva é deliciosa. Os ramos,
cobertos de flores molhadas, exalam um perfume
que me entontece. Vê-se brilhar ao sol a pele delicada
das árvores.
 
Dá pena ver tantas flores no chão. Tende piedade
das flores caídas. Não devem ser varridas e misturadas
com a lama, mas deixadas para as abelhas.
 
Os escaravelhos e as lesmas cruzam o caminho
por entre as poças de água; não quero pisá-los,
nem assustar o lagarto dourado que se espreguiça
e pisca os olhos.
 
 
 
pierre louÿs
o sexo de ler de bilitis
bucólicas em panfília
trad. maria gabriel llansol
relógio d´água
2010