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23 fevereiro 2019

joão esteves / a cor da esperança





A ambiguidade do silêncio é como o amarelo de um semáforo: só cai para o impedimento, nunca para a livre passagem. Nunca vi semáforos a mudarem de amarelo para verde, mas sempre de amarelo para vermelho. Ver um sim no silêncio é passar com o amarelo: coisa arriscada, às vezes até um pouco forçada, condescendência de mulher perante o desejo do homem. Já um não augura maiores possibilidades de sucesso: poderá demorar muito, mesmo até uma vida, mas quando mudar será certamente para a cor da esperança.


joão esteves
do lado de fora
editora urutau
2018 




17 março 2018

joão esteves / pequenas marcas




que fora dos livros
se escreva
o que fora do que se escreve
não se diz
e que fora do que se diz
se diga
o que fora do que se pensa
não se pensa.

e que dentro da alma
exista
o que fora dela não existe
para que por dentro
se realize
tudo aquilo que não se verbalize.

que portanto
estando fora estando dentro
se sobreviva
à tentação de querer estar no centro
e apenas mais um se seja
sabendo-se pequena esta marca que se deixa.



joão esteves









05 maio 2017

joão esteves / sobre tudo o que nada presta




ainda que o tempo não dê para perceber a beleza
de todas as coisas, devo pé ante pé (para não
acordar o ódio), abeirar-me do desconhecido,
daquele outro lado que ignoro. contudo, era bom que

alguém me justificasse o desconhecimento que tenho
das coisas: haverá alguma beleza em descobrir que
tudo é relevante ou que nada presta, se aquilo a que
estou condenado é ver o outro lado a partir do meu?




joão esteves






25 agosto 2016

joão esteves / nostalgia



todos os dias, há sempre um tempo
que de mim se separa.

tempo que cai de maduro,
no tempo perdido,
no tempo fingido.

tempo que empresto ao tempo,
mas que nunca revejo.

investimento mal calculado?

o tempo, por certo,
está-me a dever tempo.

dizem, contudo,
não haver outro pacto,
senão,
dar tempo ao tempo.



joão esteves