26 julho 2015

teixeira de pascoaes / e a noite, onde murmura a nossa origem,



E a noite, onde murmura a nossa origem,
Subiu comigo aos cerros do Marão.
E a estrela virgem
Da Anunciação,
Dos seus lábios, cantando e rindo nasce:
Um áureo beijo, a arder e a iluminar...
Seu cabelo aloirava; e à sua face,
Viam-se as lindas cores aflorar.

Brumas, sombras nocturnas, brandamente,
Sumiram-se, no ar...
                           E seu formoso
Corpo cruel de deusa omnipotente,
Voluptuoso,
De pé, naquela altiva soledade,
Como enlevado, extático, sorrindo,
Domina a planetária imensidade
E o céu infindo...
E aquele riso,
Doirando a serra,
É um anjo que nos mostra o Paraíso,
Além da terra.

Alto sorriso lúcido, escultura
Em luz marmórea...
O busto da esperança que fulgura,
Dentro de nós, no escuro da memória...
Ó riso, árvore de luz, solta folhagem
De azul tremente!
Ó rosto alegre, outeiro em flor, paisagem...
Idílica frescura, água corrente...
[...]



teixeira de pascoaes
1877-1952
senhora da noite



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