Choro quando o sol se põe porque
ele te esconde da minha vista e porque não sei entender-me com os seus rivais
nocturnos. Embora ele esteja baixo e agora sem febre, é impossível contrariar o
seu declínio, suspender a sua desfolhagem, arrancar ainda algum desejo à sua
desfolhagem, arrancar ainda algum desejo à sua claridade moribunda. A sua
partida funde-te com a sua obscuridade, como a lama do leito se dissolve na
água da torrente para além do entulho das margens destruídas. Dureza e moleza
de origens diferentes têm então efeitos semelhantes. Cesso de receber o hino da
tua palavra; subitamente já não te vejo inteira ao meu lado; não é o fuso
nervoso do teu pulso que eu seguro na mão, mas o ramo oco de uma qualquer
árvore já morta e gasta. Só se dá nome ao arrepio, e a mais nada. É de noite. Os
artifícios que se acendem acham-me cego.
De verdade só chorei uma única
vez. O sol ao desaparecer tinha cortado o teu rosto. A tua cabeça rolara na
fossa do céu e eu já não acreditava no futuro.
Qual é o homem da manhã e qual o
homem das trevas?
rené char
este fanático das
nuvens
poemas dos dois anos
palavra em arquipélago
(1952-60)
tradução y. k. centeno
cotovia
1995
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