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18 maio 2018

nicolás guillén / dois meninos




DOIS meninos, dois ramos de um mesmo arbusto de miséria,
juntos, na noite quente, sob o mesmo portal,
dois meninos, mendigos cheios de pústulas,
comem de um mesmo prato como cães esfomeados
a comida lançada por preia-mar de banquetes.
Dois meninos: um negro, o outro branco.

Suas cabeças unidas, semeadas de piolhos;
seus pés muito juntos e descalços;
as bocas incansáveis num mesmo frenesim de mandíbulas,
e sobre a comida gordurenta, azeda,
duas mãos: uma negra, outra branca.

Que união tão sincera e tão forte!
Estão ligados pelos estômagos e pelas noites foscas,
e pelas tardes melancólicas nos passeios brilhantes,
e pelas manhãs explosivas,
quando o dia desperta com seus olhos alcoólicos.

Estão unidos como dois bons cães…
Juntos assim como dois bons cães,
um negro, o outro branco,
quando chegar a hora de marchar
irão querer marchar como dois homens bons,
um negro, o outro branco?

Dois meninos, dois ramos de um mesmo arbusto de miséria,
Comem, na noite quente, sob o mesmo portal.


nicolas guillen
antologia poética I
tradução de carlos grifo
editorial presença
1970







27 setembro 2017

nicolás guillén / madrigal




De tuas mãos gotejam
as unhas, num cacho de dez uvas maduras.
Pele,
carne de tronco ardido,
que quando naufragas no espelho, enches
de fumo as algas tímidas do fundo.



nicolas guillen
antologia poética I
tradução de carlos grifo
editorial presença
1970





11 outubro 2013

nicolás guillén / poema seis (fragmento)



Índias Ocidentais! Índias Ocidentais! West Indies!
Este é o povo hirsuto
de cobre, multicéfalo, onde a vida luta
com o lodo seco entranhado na pele.
Este é o presídio
onde cada homem existe de pés atados.
Esta é a grotesca sede das companies and trusts.
Aqui estão o lago de asfalto, as minas de ferro
as plantações de café
os port docks, os ferry boats, os ten cents…

Este é o povo do all right
onde tudo se encontra mal
Este é o povo do very well
onde nada está bem.

Aqui estão os servidores de Mr. Babbit.
Os que educam os filhos em West Point.
Aqui estão os que chilreiam: hello baby
e fumam “Chesterfield” e “Lucky Strike”.
Aqui estão os bailarinos de fox trots
os boys do jazz band
e os veraneantes de Miami e Palm Beach.
Aqui estão os que pedem bread and butter
e coffee and milk.
Aqui estão os absurdos jovens sifilíticos
os fumadores de ópio e marijuana
exibindo as suas espiroquetas
e mandando fazer um fato em cada semana.
Aqui está o melhor de Port-au-Prince
O mais puro de Kingston, o high life de La Habana…
Mas aqui estão também os que remam em lágrimas
galeotes dramáticos, galeotes dramáticos.
Aqui estão eles
os que trabalham com uma picareta
a dura pedra onde pouco a pouco se crispa
o punho de um titã. Os que acendem a chispa
vermelha, sobre o campo ressequido.
Os que gritam: “Cá estamos!” e a quem responde o eco
de outras vozes: ”Cá estamos!”. Os que em rude tumulto
sentem latir o sangue com sílabas de insulto.


nicolás guillén
west indies, ltd
1934
tradução de nicolau saião